A palavra oblato, em quaisquer modalidades que apareça no decorrer da história monástica, vem do latim oblatus e significa “oferecido” ou “ofertado”. É secular, se vive no mundo, ou regular, se mora no mosteiro.
Escreve a propósito, Dom Filipe da Silva, OSB, Abade do Mosteiro de São Bento do Rio de Janeiro (RJ), que “o vocábulo oblação aparece 63 vezes na Sagrada Escritura. Expressões sinônimas, como oferenda (19), oferta (98), entrega (13), sacrifício (247), totalizam 440 vezes. Esta grande incidência revela que a mesma teve uma presença viva na história sagrada, atingindo seu ponto alto na [oferta] realizada por Jesus” (Oblação: oferta a Deus e aos irmãos in Oblação: oferta a Deus e aos irmãos, 2012, p. 92).
A explicação oferecida por Dom Filipe sobre o assunto é importante e merece ser aqui resumida, pois, a nosso ver, expressa bem o sentido bíblico-teológico da oblação. Com efeito, começa demonstrando que, já no Antigo Testamento, eram oferecidos ao Senhor animais, frutos ou bens da terra com a intenção de louvá-Lo, agradecer-Lhe ou pedir-Lhe perdão pelos pecados cometidos.
Nesses sacrifícios, destaca-se o uso do sangue de animais derramados em locais apropriados, especialmente nos casos de pedidos de perdão ou de expiação pelos pecados do homem que, não podendo derramar seu próprio sangue – Deus a ninguém permite tirar a própria vida ou a de outrem –, fazia sua oblação pelo sangue de um bicho a fim de demonstrar arrependimento e, desse modo, unir-se, novamente, ao Senhor. No entanto, tais sacrifícios eram precários, imperfeitos e, por isso mesmo, incapazes de tirar o ser humano do pecado (cf. Am 5,21-27). Afinal, como poderia o sangue de animais irracionais, inferiores ao ser humano e inconscientes do pecado, obter a pureza da consciência humana?
É por essa razão que Deus, na “plenitude dos tempos” (Gl 4,4), enviou seu Filho para que oferecesse o seu próprio corpo e sangue em nome de toda a humanidade a fim de redimi-la do pecado e abrir-lhe as portas do céu. Nesse sacrifício já não são mais seres irracionais as ofertas, mas o próprio Cordeiro sem defeitos que se oferece, ou seja, o Filho mesmo de Deus, Jesus Cristo (cf. 1Pd 1,18-19).
Pode-se dizer, todavia, que o sacrifício de Cristo na Cruz foi o coroamento de suas oblações anteriores em uma vida toda ofertada ao Pai pela salvação do mundo (o nascimento em Belém, a fuga para o Egito, o trabalho em Nazaré, a pregação, os milagres etc.) a fim de reparar pela obediência a desobediência de Adão (ver: Estêvão Bettencourt, OSB, Curso de Iniciação Teológica. Rio de Janeiro: Mater Ecclesiae, 2013, p. 152-158).
Mais: dentre as oblações de Nosso Senhor destaca-se a oração, pois é nesses momentos que aparece o homem unido ao Pai a fim de nutrir-se das forças d’Ele e, assim, oferecer-se aos irmãos. Os Evangelhos nos atestam o quanto Jesus rezava (cf. 6,12; 9,28; 22,41-44), mesmo de madrugada (cf. Mc 1,35; 6,46; Lc 5,16), assim como ensinou os próprios discípulos a rezarem (cf. Lc 11,1) e recomendou o ideal da oração contínua (cf. Lc 18,1) e também recolhida em nossa profundidade interior, onde se dá o verdadeiro encontro com Deus em favor dos irmãos (cf. Mt 6,6), conforme Ele mesmo nos oferece o exemplo.
Portanto, o (a) oblato(a) imita a Cristo que se doou ao Pai por nós. É ele o modelo primeiro de oferta a Deus e aos irmãos e deve, na oblação, imitá-Lo, não deixando que nada, absolutamente nada, se anteponha ao amor de Cristo (cf. Regra de S. Bento 58,7; 4,21) para com o próximo.
O (a) oblato(a) – que a grande maioria dos mosteiros aceita – é, portanto, chamado a ser essa testemunha viva de Cristo no contexto em que está inserido(a), pela oração, pelo exemplo e pela palavra.
Ir. Vanderlei de Lima é eremita na Diocese de Amparo