Padre Ademir Bernardelli – Assessor e Coordenador da Campanha
da Fraternidade e Campanha para a Evangelização
No último dia 14 de fevereiro iniciamos a quaresma e com ela a nossa reflexão como Igreja a respeito da CF de 2018. Em sintonia com a necessidade de refletir sobre temas que afligem a sociedade, a CNBB – na Campanha da Fraternidade 2018 – indica a violência como assunto a ser debatido por todas as pessoas de boa vontade, em busca de soluções capazes de superarem um estado de coisas que não respeita a dignidade das pessoas.
Com efeito, no Texto-Base da CF 2018, a CNBB afirma: “Nesta Campanha da Fraternidade desejamos refletir sobre a realidade da violência, rezar por todos os que sofrem violência e unir as forças da comunidade para superá-la. (…) Os índices de violência no Brasil superam significativamente os números de países que se encontram em guerra ou que são vítimas frequentes de atentados terroristas”.
A CNBB, mais uma vez, manifesta seu compromisso de apoio aos empobrecidos e a todos que sofrem com as violências perpetradas socialmente ou por meio institucional. Impossível a convivência passiva ante o descalabro reinante no país, quando milhões de brasileiros carecem do mínimo de condições para uma vida condigna; aliás, “ao inviabilizar a formação dos mais pobres para a autonomia de pensamento, restringir os horizontes do interesse pelo exercício da cidadania, limitar as possibilidades de participação ativa na política, o Estado, outras instituições brasileiras e os segmentos sociais das elites contribuem para a continuidade de relações sociais pautadas na exclusão, no autoritarismo e na violência” (Texto-Base, página 25 nº 57).
Ressalte-se que o documento da Entidade se baseia em pesquisas de órgãos responsáveis, a exemplo do Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores dos Direitos Humanos, cujos índices de violência são inaceitáveis: 61.163 homicídios; 7 pessoas mortas por hora; 2,6 mil latrocínios; 4,2 mortos em ações policiais; 49 mil estupros. Há mais vidas dilaceradas por variadas violências: a fome que ronda os lares dos mais pobres, a incúria hospitalar, o desemprego, a inépcia, a desonestidade dos servidores públicos de todos os matizes, a sonegação empresarial e muitas outras.
Em solenidade de abertura da CF 2018, Dom Sergio da Rocha, Presidente da CNBB, relembrou o compromisso opcional pelos pobres, ao declarar: “A vida e dignidade das pessoas e de grupos sociais mais vulneráveis são continuamente violados de muitos modos” (…) “A indignação diante da violência representada pelas situações de exclusão e negação dos direitos fundamentais, especialmente dos mais pobres e fragilizados, não pode ser menor do que a despertada por crimes bárbaros”.
É importante registrar a presença da Presidente do STF na abertura da CF, que se comprometeu com os objetivos da Campanha. Tal participação reflete a tradição da CNBB de sempre se colocar numa postura de diálogo e no horizonte de assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, conforme determina a Constituição Federal.
Na abertura da CF 2018, manifestei-me com relação à violência que vitima a comunidade negra, mormente os jovens negros, realidade também revelada no Texto-Base. Negras, negros, indígenas, grupos sociais marginalizados em razão de preconceitos são os maiores alvos de ações violentas físicas e ou psíquicas.
A CF 2018 oferece a oportunidade de diálogo entre Estado e sociedade, lembra-lhes o dever de garantir a justiça e a paz em favor de todos os cidadãos, e de sustentar o equilíbrio verdadeiro mediante equânime distribuição das riquezas.
Evidentemente que, ao agir na perspectiva dos interesses dos mais vulneráveis, a CNBB nem sempre é compreendida pelas franjas autoritárias presentes na sociedade brasileira. Estas, presas em suas leituras herméticas, preconcebidas e raramente pastorais, são portadoras de teses absurdas e distantes da realidade do povo de Deus.
A intervenção federal, sob comando militar no estado do Rio de Janeiro, deve ter por escopo a garantia da inviolabilidade do lar, da cidadania e não somente os patrimônios, quer sejam públicos ou privados. Além do mais, a prevenção é indispensável, bem como mecanismos de atendimento aptos à saúde, à educação, ao transporte, ao emprego, ao lazer e aos direitos impostergáveis para uma comunidade viver em paz.
Certamente, a CF 2018 será um tempo forte e favorável de conversão, de mudança de vida, dentro do horizonte e dos mistérios da Páscoa do Senhor, vendo em cada ser humano a dignidade de filhos e filhas, cujos rostos são muitas vezes desfigurados pela violência.
Também nos fala o Presidente da CNBB, cardeal Sergio da Rocha que: “Escutar a voz de Jesus implica em viver no amor fraterno”. Este é o ponto de partida da reflexão apresentada pelo arcebispo de Brasília (DF). Dom Sergio lamenta o fato de que muitos católicos têm compartilhado e alimentado agressividade nas redes sociais e exorta: “É pecado grave usar o nome de Deus ou qualquer religião para praticar ou justificar a violência”. Fala da Quaresma como “tempo especial de conversão em preparação para a Páscoa”, e que deve ser vivido através da caridade, como ensina a Igreja.
A Campanha da Fraternidade (CF) está entre os principais meios de vivência do amor ao próximo na Quaresma, segundo o presidente da CNBB: “Ela é um meio especial para a conversão e a verdadeira caridade”. Para dom Sergio, o lema “Vós sois todos irmãos” pretende contribuir para superar a violência e promover a paz.
O cardeal ressalta que muitas iniciativas podem ser desenvolvidas para alcançar os objetivos da CF deste ano e que cada um pode dar a sua contribuição “para superar a violência e construir a fraternidade e paz nos ambientes em que vive”. Mas lamenta a agressividade crescente “compartilhada e alimentada por muitos católicos nas redes sociais”.
“Diga não à violência nas redes sociais! Não compartilhe conteúdos ofensivos e desrespeitosos. Não participe de grupos de WhatsApp ou de outras redes sociais que disseminam fofocas, fazem linchamento moral e críticas destrutivas, atingindo até mesmo a Igreja”, conclama. Procure divulgar coisas boas e incentive a paz e a concórdia entre todos; evite ficar discordando disso ou daquilo, vamos plantar no coração das pessoas um pouco mais de amor e paz.
Para o cardeal, é lamentável que haja pessoas ou grupos que se dizem cristãos ou católicos recorrendo à violência para fazer valer a sua opinião e interesses: “É pecado grave usar o nome de Deus ou qualquer religião para praticar ou justificar a violência”, exorta.
“Quem escuta a voz de Jesus Cristo não alimenta, nem reproduz a violência disseminada na sociedade. Ao contrário, contribui para a paz, através do respeito e do diálogo, da misericórdia e do perdão. Quem escuta a voz de Jesus testemunha a sua palavra “Vós sois todos irmãos”, jamais tratando o outro que pensa diferente como um inimigo a ser combatido, mas como um irmão a ser amado, se necessário com a correção fraterna e o perdão. A paz é dom de Deus a ser compartilhado nesta Quaresma”; pratique isso em sua paróquia e em sua comunidade; façamos do mundo um lugar melhor para se viver sem ódio e sem guerra.