Ele veio para o que era seu, mas os seus não o receberam. Teremos lugar para Deus, quando Ele tenta entrar em nós? Geralmente, o que diz respeito a Ele nunca parece uma questão urgente. O nosso tempo já está completamente preenchido.
Se ele bate à porta do nosso pensamento, arranjamos um raciocínio qualquer para afastá-lo; o pensamento, para ser considerado sério, deve ser configurado de modo que Deus se torne supérfluo. E também nos nossos sentimentos e vontade não há espaço para Ele. Estamos tão completamente cheios de nós mesmos, que não resta qualquer espaço para Deus. E por isso não há espaço também para os outros.
Os anjos anunciaram o Salvador recém-nascido com um hino de louvor. Seu canto é uma irradiação da alegria que deriva da simples percepção do esplendor da verdade e do amor de Deus. E de fato, com a glória de Deus nas alturas está relacionada a paz na terra entre os homens. Onde não se dá glória a Deus, onde Ele é esquecido ou negado, também não há paz. Há quem afirme o contrário, que as religiões seriam a causa da violência e das guerras no mundo, e que seria preciso libertar a humanidade das religiões, para haver paz. É verdade que a fé pode ser pretexto para a intolerância e a violência, quando mal compreendida. Mas, mesmo que a religião seja às vezes mal usada, nem por isso é verdade que o «não» a Deus restabeleceria a paz. Se a luz de Deus se apaga, apaga-se também a dignidade divina do homem. Este deixa de ser a imagem de Deus, que devemos honrar em todos e cada um. Deixamos de ser todos irmãos porque filhos do único Pai. Só quando a luz de Deus brilha no homem, só quando cada homem é querido, conhecido e amado por Deus, só então, por mais miserável que seja a sua situação, a sua dignidade é inviolável. E realmente, apesar dos casos de mau uso da religião, da fé no Deus que Se fez homem nunca cessaram de brotar forças de reconciliação e magnanimidade. Na escuridão do pecado e da violência, esta fé fez entrar um raio luminoso de paz e bondade que continua a brilhar.
À voz do anjo, os pastores apressaram-se a ir a Belém. No nosso caso, talvez muito raramente nos apressemos pelas coisas de Deus. Hoje, Deus não faz parte das realidades urgentes. E todavia Ele é a realidade mais importante, o Único que, em última análise, realmente importa. Supliquemos que a santa curiosidade e alegria dos pastores nos toquem também nesta hora e nos conduzam até Belém, ao encontro do Senhor que hoje vem de novo para nós.
Papa Bento XVI
Texto integrante do folheto ‘DEUS CONOSCO | A PALAVRA ILUMINA – DIOCESE DE AMPARO’ (25.12.17 – Natal do Senhor)