“O fogo que Jesus veio lançar sobre a terra – diz o teólogo suíço Hans Urs von Balthasar – é o fogo do amor divino (o Espírito Santo) que deve apossar-se dos homens. É a partir da cruz, esse temido ‘batismo’, que ele começa a arder. Mas não são todos, longe disso, que se deixarão dominar pela exigência absoluta deste fogo, de modo que esse amor que quereria – e poderia – conduzir os homens à unidade, divide-os por causa de sua resistência. De modo ainda mais nítido e inexorável que antes de Cristo, a humanidade se dividirá em dois reinos ou agrupamentos, que Agostinho chama de ‘Cidade de Deus’, dominada pelo amor, e a ‘Cidade deste mundo’, dominada pela cobiça.”
Tal divisão chega a rachar as famílias, tal a radicalidade que o testemunho de Cristo exige. A “nuvem de testemunhas” que hoje nos anima a seguir Cristo no caminho da cruz (2ª leitura) é formada pelos mártires, que “já resistiram até o sangue em seu combate contra o pecado”!
Sim, porque essa divisão de que Cristo fala acontece também (e principalmente) dentro de nós… Nossa vida é um combate constante entre o bem e o mal, do qual nem mesmo os santos escapam, como São Paulo, que se lamenta: “Sou capaz de querer o bem, mas não sou capaz de realizá-lo. Não faço o bem que quero, mas o mal que não quero…” (Rm 7, 18-19). Aliás, a questão não é que “nem mesmo os santos escapam” desse combate: na verdade, só os santos o travam… Porque os que estão vendidos ao pecado já não têm a força, nem o desejo de combater, e se rendem, aceitando a escravidão. Se há em nós combate, e se a “divisão” provocada pelo Espírito está presente em nós, isso é um bom sinal.
Quando somos perseverantes no combate, Deus vem em nosso socorro e nos salva, tirando-nos da cova (1ª leitura e salmo). Vivemos hoje tempos tão ou mais difíceis que aqueles das primeiras testemunhas, e mais do que nunca somos chamados a seguir Cristo em seu batismo de cruz, rejeitando o fardo do pecado que nos pesa e dificulta a corrida, e aceitando a morte que a fidelidade nos impõe, para que o nosso testemunho ajude a acender no mundo o fogo do Espírito. Oxalá saibamos ler os sinais dos tempos…
Margarida Hulshof – Paróquia Divino Espírito Santo/Holambra
Texto integrante do folheto ‘DEUS CONOSCO | A PALAVRA ILUMINA – DIOCESE DE AMPARO’ (14.08.16 – 20º Domingo Comum)