A LITURGIA NO TEMPO

Artigos de Liturgia, n. 10; Novembro de 2016

Seminarista Rafael Spagiari Giron
Assessor da Pastoral Litúrgica Diocesana

Queridos irmãos e irmãs, filhos amados de Deus!

           Após refletirmos sobre a elaboração e existência dos livros e rituais litúrgicos, debruçaremos nosso estudo sobre o Ano Litúrgico; mas antes, torna-se necessário compreendermos a importância do Tempo dentro do âmbito litúrgico.

           Celebrar nossa fé, além da Memória do Mistério Pascal de Jesus, é também ter presentes os acontecimentos diários de nossa vida, ligando-os à vida de Cristo. Para que possamos nos organizar nas celebrações, utilizamos a realidade temporal como orientação e marco para nossos cultos (marcamos um dia, um horário, e todos se encontram por causa dessa organização, que é puramente temporal e humana). A esse Tempo nós chamamos de cronológico. No entanto, a liturgia está para além desse Tempo cronológico; ela está voltada para a “pedagogia divina” que nos revela a existência de um tempo chamado de kairológico (o Tempo da manifestação da Graça de Deus; Tempo em que Deus está presente no meio de seu povo).

            Sabemos que para Deus não há tempo cronológico. Deus não está submisso ao tempo; mas Ele é o Criador do tempo. Como Criador, Ele nos insere nessa realidade temporal para cumprirmos nossa missão e experimentar sua Graça capaz de nos salvar e nos dar a vida eterna que, por sua vez, também não está submissa ao tempo cronológico. Mas, se Deus e a vida eterna não estão submissos ao Tempo, para que serve o Tempo Cronológico?

           O Tempo cronológico torna-se para nós uma realidade simbólico-sacramental, ou seja, um momento visível da atuação de Deus na história. Se pegarmos o dicionário da língua portuguesa, veremos que o Tempo é designado como a sucessão dos anos, dos dias, das horas, e tem a ver com o passado, presente e futuro. É essa realidade temporal que queremos tornar símbolo na liturgia. Por isso, o Tempo, mais do que nos deixar experientes ou idosos, também nos forma espiritualmente para a Vida eterna.

           Na Bíblia, mais precisamente no Antigo Testamento, a concepção do Tempo faz eco à presença de Deus na história do povo de Israel, um povo chamado à Aliança visualizada na fidelidade a Deus. O Tempo Sagrado bíblico não é visto como fuga da realidade humana, mas sim como Tempo da presença de Deus nos acontecimentos diários. Como exemplo podemos tomar Gn 1, 1-2 (Deus que cria tudo, inclusive o Tempo); Ecl 3, 1-8 (Tempo como medida e dimensão na qual tudo se realiza). Já no Novo Testamento, o Tempo ganha seu sentido com o grande “Evento Jesus Cristo” (Encarnação, Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus). É Deus que se submete ao Tempo para nos libertar. A partir desse momento o Tempo ganha um sentido novo de celebração, a celebração do Mistério Pascal.

           Com Jesus Cristo, o Tempo torna-se “matéria” de um ato sacramental que transmite a Salvação, ou seja, é no Tempo que a Salvação acontece; Deus utiliza esse momento na vida de cada pessoa para salvá-la eternamente.

           A liturgia, enquanto celebração (serviço comunitário em louvor a Deus) vive essas duas dimensões do tempo (cronológica e kairológica). Cronológica enquanto está inserida no tempo humano e procura, por meio da vida de cada pessoa, elevar um culto a Deus. Kairológica enquanto celebra o Memorial do Mistério Pascal de Jesus que, não é apenas lembrança do passado, mas atualização da Salvação oferecida por Jesus na cruz (para maiores informações sobre o Memorial, veja o Artigo n. 1). Por isso, a liturgia é um sair, e, ao mesmo tempo, permanecer na realidade temporal em que estamos; é o encontrar Deus com nossa vida, sabendo que, para além dessa realidade temporal em que estamos inseridos, há a vida eterna para a qual ela é uma preparação.

           Vivemos a liturgia a partir de três ritmos: o diário, o semanal e o anual.

RITMO DIÁRIO: ofício da manhã (o nascer do sol, amanhecer, novo dia – simbolizando a ressurreição de Cristo e a nossa Ressurreição nele) e ofício da tarde (pôr do sol, noite, trevas, escuridão, simbolizando a morte, acendemos nossas velas, expressando a fé na ressurreição).

RITMO SEMANAL: entre os sete dias da semana um se destaca: o domingo. Primeiro dia da semana, dia da festa primordial dos cristãos em que comemoramos a Ressurreição de Jesus. O que a caracteriza é a reunião no domingo para a celebração eucarística.

RITMO ANUAL: o ritmo anual nos leva a uma dinâmica de progressão da fé. Quando se muda o Ano Litúrgico e inicia-se outro ciclo, estamos inseridos numa dinâmica de crescimento espiritual e não de retorno. O decorrer do ano revela todo o Mistério de Cristo, desde a Encarnação e Natividade até a Ascensão, o dia de Pentecostes e a expectativa da feliz esperança e vinda do Senhor. Também temos o domingo como centralidade, porém, o destaque maior é o dia da Ressurreição do Senhor (Vigília Pascal).

            Todo esse artigo nos prepara para o próximo que trará o Ano Litúrgico. No próximo veremos como a realidade do Tempo cronológico e kairológico se misturam na Liturgia da Igreja. Por hora, vivamos esse Tempo presente na Graça que vem de Deus e nos transforma, enchendo o nosso coração de esperança na vida que é eterna e ultrapassa todo entendimento.

Para ler o artigo n. 9 clique aqui: OS LIVROS E RITUAIS LITÚRGICOS

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